segunda-feira, dezembro 06, 2010

~ As memórias do diário.


- Carolina querida. – Gritou minha mãe das escadas de casa.

- Sim mãe, estou aqui fora. Sentada ao lado da fonte. – Respondi sem tirar os olhos do sol que brilhada no céu, mais precisamente por trás das árvores.

- Querida, isso chegou para você. – Minha mãe ergueu a mão com um pequeno livro a me entregar.

- Quem deixou? – Perguntei olhando para a porta.

- Não sei filha, apenas largou na sua janela. A Susana foi quem encontrou quando estava brincando por lá. – Respondeu minha mãe entregando-me o livro.

- Obrigada mãe. – Agradeci recebendo-o.

- Espero que tenha uma história que você venha a gostar. – Disse minha mãe sorrindo.

- Também espero. – Respondi com um sorriso um pouco fechado observando ela afastar-se.

“Novembro de 1797,

Encontro-me completamente angustiado, ela é tão bonita e eu sou tão plebeu, como chegar perto dessa linda mulher se não aprendi, ao menos falar devidamente, não agüento mais este impasse, está corroendo-me. Meu único refúgio são essas páginas, cada palavra árdua que coloco aqui, tira do meu peito um pouco da dor de não ser, adequado...”

Me bastou ler apenas algumas das palavras escritas nesse diário, para perceber que o rapaz que as escrevia amava arduamente uma mulher, essa não sabia do seu amor, ou muito menos o olhou como homem uma vez que fosse. A cada página que lia me tornava mais curiosa em saber quem era esse rapaz doce e gentil, a qualquer mínimo detalhe que ele citava me pegava prestando bastante atenção para ter uma pista que fosse. Depois de algum tempo foi que me perguntei por que aquele diário havia sido deixado na minha janela, porque justamente na minha janela, o que ele tinha haver comigo? Não consegui uma ligação imediata, então continuei a ler.

“Dezembro de 1797,

Não consigo acreditar, ela me olhou, mesmo que pelo canto dos seus belos olhos castanhos escuros, mas me olhou. Senti vontade de acenar, porém seu pai estava ao seu lado, fiquei com medo que ele me interpretasse como atrevido, um maldito construtor atrevido. Será que ela me notou? Será que estava olhando para outro local e nem se quer percebeu minha interpretação precipitada? Gostaria muito de ter as respostas para todas as minhas perguntas, mas não as tenho, então continuo aqui, com meu sentimento, recolhido a meu peito...”

Fiquei tão entusiasmada nas páginas seguintes, pois ele sempre se referia a ela em momentos pequenos, mas eram momentos tão reais e absolutos para o coração daquele rapaz, não consegui recolher minha alegria ao pensar que ele poderia estar sendo correspondido com pequenos sinais, entretanto não conseguia imaginar se essa “reciprocidade” fosse uma mentira. Passei a diante de umas páginas, pois estas estavam vazias, ou para não dizer completamente vazia, nessas estavam escritas apenas as datas do decorrer dos dias. Não demorei muito até parar em uma página relativamente bem escrita, nessa porém existia algo diferente, existia uma flor de cor azul murcha, acredito que tenha sido deixada ali a meses para estar de tal forma, confesso que isso me chamou atenção, portanto fui ler o que ali encontrava-se escrito.

“Janeiro de 1798,

Conversei com ela, quase não consegui conter meu entusiasmo ao vê-la parada na varanda do meu quarto, na verdade a varanda dos quartos do alojamento, é, é exatamente isso que você está imaginando, eu fui convocado para a guerra. Não pude pensar em partir sem ao menos olhá-la de perto, então saí, e a vi virar em minha direção assustada e colocar a mão em seu peito, sorri gentilmente e pedi desculpas pela minha imprudência, assim a convidei para sentar em um pequeno banco existente na frente dos alojamentos e, ela, aceitou cordialmente...”

- Não, não pode ser... – Falei abismada, em seguida continuei a ler.

“(...) Perguntei-lhe o que uma moça fazia em um lugar como aquele, um alojamento masculino, ela explicou-me que seu irmão havia sido convocado assim como a mim e, como em dois dias ele viajaria ela e as irmãs haviam ido visitá-lo. Porém, ela não havia agüentado ver a felicidade das irmãs mais novas ao reverem o irmão, sem perceber que ele poderia ou não retornar dessa guerra, sendo assim ela saiu do quarto e ficou na varanda. Lamentei pelo que estava acontecendo com a família dela, e a fiquei olhando apertar as próximas mãos paradas em cima da perna, não me contive e segurei suas mãos tentando fazer com que sua angustia passasse, então ela me abraçou chorando, começou a me pedir desculpas pelo incomodo que estava a me causar, não sabia ela que não era incomodo algum para mim. Depois que as lágrimas passaram, ela me olhou intensamente, fiquei sem jeito, mas ela elogiou meus olhos verdes, dizendo que eram o espelho da minha alma, não pude mais esconder nada do que sentia, simplesmente a beijei, docemente e gentilmente como ela merecia, segurei seus cabelos castanhos escuros em meus dedos calejados de trabalhar, senti seus lábios macios sobre os meus, naquele exato e pequeno momento, aquela linda moça era minha...”

- Luís, como você não foi capaz de me dizer tudo isso? Como não fui capaz de dizer tudo que comecei a sentir por você depois daquele beijo? – Falei chorando ao fechar o diário.

Saí correndo com o diário nas mãos, subi as escadas que davam para a cozinha da casa a procura da minha mãe.

- Mãe, mamãe. – Gritei desesperada.

- Sim Carolina, estou aqui filha. – Respondeu minha mãe saindo do quarto das minhas irmãs.

- Mão, diga-me onde o Carlos pegará o carro para a viagem. – Pedi calorosamente tocando seu braço.

- Na frente do alojamento dos convocados filha, o que houve? – Ela perguntou.

- Depois explico-me mão, preciso ir. – Respondi segurando minha saia e correndo para pegar meu cavalo. – Vamos Destros, você não pode me deixar na mão agora. – Montei-o.

Cavalguei todos os pastos e campos até chegar a cidade, estava uma correria eu não conseguia enxergar absolutamente nada. A chuva não tardou a cair, encontrava-me totalmente ensopada, desci do cavalo, amarrei a saia do vestido na altura do joelho e sai correndo, perguntando a quem encontrava pela frente se haviam visto o carro partir, mas ninguém sabia me dizer. Depois de quase desistir ouvi uma voz chamar meu nome.

- Carolina, Carolina. – Gritava a voz.

- Onde você está? – Gritei de volta.

- Carolina, vamos sair dessa chuva. – Era meu irmão Carlos a abraçar-me para sairmos da chuva.

- Carlos, graças a Deus, vocês ainda não viajaram? – Perguntei aflita.

- Por causa da chuva a viagem foi adiada para amanhã. – Respondeu ele.

- Carlos o, o Luís também ficou? – Perguntei vergonhosa.

- Ficou sim querida irmã, ele está no alojamento. – Respondeu sorridente. – Vá ao encontro dele, acredito que ele ficará feliz em vê-la.

- Obrigada Carlos. – Respondi sorridente abraçando-o.

Corri até o alojamento pelas ruas empossadas, ao chegar ao meu destino, respirei fundo e bati na porta do quarto dele. Ouvi quando ele disse que estava aberta, então entrei.

- Desculpa não ter ido abrir é que... Carolina. – Disse ele surpreso.

- Oi Luís. – Falei vergonhosa.

- Você precisa se enxugar, espera um segundo, vou pegar uma toalha. – Ele disse. – Tome.

- Obrigada Luís, mas meu propósito aqui é outro. – Disse passando a tolha no rosto.

- O que foi? Aconteceu alguma coisa? – Ele perguntou preocupadamente.

- Aconteceu, um diário foi deixado na minha janela, ele contava tudo sobre um suposto rapaz que se apaixonou por uma moça que nunca o tinha visto como hoje. – Falei olhando seu rosto.

- Não acredito, meu diário sumiu a dois dias, como foi?.... Seu irmão. – Ele mesmo respondeu a pergunta.

- Carlos? – Perguntei sem entender nada.

- Sim, quando entrei no alojamento no dia que a beijei seu irmão estava na porta e meu deu um sorriso amistoso. – Respondeu ele mexendo nos cabelos que caiam na testa.

- Agora entendi tudo. – Falei.

- Desculpe-me se o que estava escrito não lhe agradou, sinto muito por tudo que sinto... – Ele dizia até eu o interromper.

- Não se desculpe por favor, lendo tudo que você escreveu percebi o quanto fui boba, como deixei passar tanto tempo sem te notar... – Disse e respirei para continuar. – Até que depois daquele beijou eu descobri o que sentia, mas não tive coragem de dizer-lhe a verdade. – Falei abaixando a cabeça.

- Carolina, eu amo você. – Ele disse tocando minha face.

- Eu o amo. – Respondi beijando-o.

Não tive coragem de deixá-lo aquela noite, pois no outro dia não teria como impedi-lo de viajar. Naquela noite, aquela pequena noite, aquele gentil rapaz seria meu.

- Pauta para o Bloínquês.

+ 6ª edição roteiro.

Um comentário:

  1. Que lindo texto!
    Amei a história, ficou realmente muito linda, e espero que ganhe!

    Beijos, Dreams.

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